Os diferentes tipos de ações musculares afetam diretamente a forma com a qual o tecido muscular realiza as contrações. Nesse sentido, essa característica fisiológica desperta o interesse de cientistas do exercício e praticantes de treinamento de força.
Inegavelmente, as ações excêntricas têm recebido maior atenção. Portanto, veremos quais os efeitos de diferentes manipulações nessa variável e como isso afeta as adaptações ao treinamento!
Tipos de ações musculares do treinamento de força.
As ações musculares são diferentes formas com as quais o tecido muscular pode ser contraído quando submetido a uma sobrecarga. Dessa forma, o tipo de ação muscular afetará diretamente as forças impostas aos diferentes tipos e quantidades de proteínas musculares responsáveis pela contração.
Veja a seguir os 3 tipos de ação muscular:
- Concêntrica: nesse tipo de ação, a força gerada pela contração vence a carga externa. À medida que o músculo contrai ocorre o encurtamento do sarcômero (aproximação das linhas Z em direção a linha M). Quando isso acontece, mais pontes cruzadas (ligações de actina e miosina) são formadas. Nesse sentido, as ações musculares concêntricas têm um grande potencial para recrutar um grande número de unidades motoras.
- Excêntrica: nas ações excêntricas a carga externa vence a força gerada pela contração muscular. Portanto, ocorre o estiramento do sarcômero (afastamento das linhas Z). À medida que o sarcômero é estirado, menos pontes cruzadas são formadas.
- Isométrica: a magnitude da força muscular gerada é similar à da carga externa. Nesse caso, não ocorre encurtamento ou estiramento do sarcômero. Contudo, as pontes cruzadas são formadas para que a carga externa seja sustentada em uma determinada amplitude articular.
Ênfase em ações musculares específicas.
Tradicionalmente, o treinamento de força é prescrito sem que uma ênfase seja dada em uma dessas ações musculares específicas. Dessa forma, as diretrizes recomendam que os programas de treinamento desenhados para aumentar força e massa muscular contemplem majoritariamente ações concêntricas e excêntricas.
Contudo, algumas estratégias propõem que uma ênfase seja dada a tipos específicos de ação muscular. Em especial, tem sido sugerido que a ênfase nas ações musculares excêntricas pode otimizar as adaptações ao treinamento.
Fisiologia do treinamento excêntrico!
Para entendermos qual o apelo dessas estratégias, precisamos entender os pressupostos fisiológicos que sustentam a utilização dessa estratégia. Como vimos anteriormente, na fase excêntrica do movimento, menos pontes cruzadas são formadas devido ao afastamento das linhas Z do sarcômero.
Apesar disso, é nesse tipo de ação muscular que maiores níveis de força total são produzidos. Isso acontece devido à ação de proteínas não contráteis e/ou elásticas como a titina e a desmina. A ação dessas proteínas durante a fase excêntrica faz com que a força passiva (gerada pelas proteínas não contráteis) aumente.
Esse fenômeno compensa o menor número de pontes cruzadas (e consequentemente menor força ativa), fazendo com que a força total aumente (força ativa + passiva). Se acaso quiser uma revisão aprofundada sobre o tema, acesse esse artigo!
Com isso em mente, vejamos agora como o treinamento geralmente é prescrito. Habitualmente, a intensidade é determinada com base na força máxima avaliada concentricamente (ex: teste de 1-RM).
Tomemos como exemplo um sujeito que treina com 80%-1RM concêntrico. Embora as ações concêntricas estejam sendo realizadas com os 80%-1RM, as excêntricas estarão sendo realizadas com uma intensidade menor – pelo fato da maior produção de força nessas ações musculares.
Esse fenômeno fez com que técnicos e atletas pensassem que durante as ações excêntricas o músculo estaria sendo “subtraindo”.
Sistema de excêntricas acentuadas.
Para tentar contornar esse fenômeno, diversos treinadores e/ou atletas propuseram que uma carga adicional seja aplicada durante as ações musculares excêntricas. Isso pode ser feito de 3 formas:
- Um assistente fica responsável por aumentar a carga nas ações excêntricas por meio de anilhas ou ajustes no próprio equipamento;
- O próprio assistente aplica uma força contrária na barra ou equipamento durante as ações excêntricas, ou;
- Uma carga mais elevada é utilizada desde o início da série para as ações excêntricas e o assistente auxilia na execução das ações concêntricas.
A primeira forma permite que um ajuste mais fino seja realizado, já a segunda e terceira, permite que o método seja aplicado de forma mais prática.
Embora a utilização desse método faça sentido do ponto de vista fisiológico, essa lógica tem sido desafiada. De fato, diversos estudos demonstraram que o sistema de excêntricas acentuadas não é capaz de potencializar os aumentos na área de secção transversa muscular comparado ao treinamento tradicional, especialmente quando o volume total é equalizado (1, 2).
Treinamento puramente excêntrico ou concêntrico.
Como vimos, enfatizar as ações musculares excêntricas parecem não potencializar a hipertrofia muscular. Mas qual o efeito de se realizar o treinamento apenas com ações musculares excêntricas?
Esse paradigma já foi investigado pela ciência (3). Os autores compararam o treinamento feito com ações excêntricas máximas ou concêntricas máximas na hipertrofia muscular. Como resultado, a realização do treinamento puramente excêntrico ou concêntrico não foi capaz de potencializar os aumentos na área de secção transversa muscular quando o volume total foi equalizado.
Prescrição das ações musculares no treinamento de força.
As estratégias que tem como objetivo enfatizar determinadas ações musculares podem ter uma logística difícil e parecem não potencializar a hipertrofia muscular. Portanto, não é necessário enfatizar determinadas ações musculares para sujeitos que podem treinar de forma tradicional. Apesar disso, essas estratégias ainda podem ser uteis em algumas situações específicas.
Tomemos como exemplo o caso de idosos frágeis com baixo nível de força muscular e dificuldades para se levantar e/ou locomover. É possível fazer um treino de membros inferiores onde o idoso receberá ajuda para se levantar de uma cadeira – ou seja, na fase concêntrica do movimento, onde há uma menor produção de força. Em seguida, o idoso irá se sentar novamente com pouca ou nenhuma ajuda – ou seja, a fase excêntrica do movimento, onde há maior produção de força.
Esse treino de agachamento na cadeira com ênfase na fase excêntrica pode ser realizado até que o idoso aumente seu nível de força/funcionalidade. A partir disso, o treinamento pode ser progredido até que o idoso consiga realizar as fases concêntricas e excêntricas sem auxílio. Em fases mais avançadas do treinamento, é possível a implementação de cargas externas para realizar a progressão do treinamento.
Conclusão.
Cada tipo de ação muscular afeta diferentemente a forma com a qual o músculo contrai. Dentre os tipos de ações musculares, a ação excêntrica tem recebido maior atenção. Embora a ênfase na ação excêntrica não seja capaz de potencializar a hipertrofia muscular, essa estratégia pode ser útil para sujeitos que não conseguem treinar da forma convencional.
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